Seu Silêncio é Um Joelho no Meu Pescoço

Pra falar a verdade, eu planejava escrever sobre outra coisa. Tinha pensado em falar sobre a próxima temporada da WNBA e o que esse momento significa para o basquete feminino.

Mas agora não dá.

Porque agora... Só tem uma coisa na minha mente. Agora, preciso me ater à realidade. Como uma pessoa negra nascida nos Estados Unidos, só tem uma coisa que poderia estar na minha mente.

E isso é temer pela minha vida.

É temer pela minha vida e pela vida de todas as outras pessoas que não são culpadas de nada além de pertencer a uma raça que sempre foi oprimida neste país. É querer permanecer viva — numa época em que muitas pessoas parecem não se importar comigo.

É 2020, cara. Era pra ser o futuro, sabe o que quero dizer? Quando era criança, se você dissesse “o ano 2020”, parecia uma parada de Star Trek. Parecia uma possibilidade infinita. Mas o que você descobre à medida que envelhece é que, se você é uma garota negra nos EUA, o futuro simplesmente... Não tem tantas possibilidades assim. Você começa a notar quantas forças existem para garantir que 2020 não seja tão diferente de 2010. Ou 2000. Ou 1990. Ou 1920. Você começa a entender que os sistemas de poder neste país não foram construídos para criar possibilidades ou oportunidades para os negros — eles foram construídos para nos barrar do lado de fora.

Os sistemas de poder existem para manter o status quo dos brancos.

Para que, em 2020, George Floyd possa ter seu pescoço enforcado pelo joelho de um policial branco, por alguém cujo trabalho era servi-lo e protegê-lo, por quase nove minutos em plena luz do dia — NOVE minutos em em plena luz do dia — mesmo depois de ele ter ficado desacordado. Os sistemas de poder dos EUA existem para que uma resposta aceitável a um policial matando George Floyd é pedir desculpas ao policial. Os sistemas de poder dos EUA existem para que George Floyd, uma vítima negra de assassinato, possa ser culpado por seu próprio assassinato.

Mas sabe o que mais me pega?? É como os sistemas de poder neste país são construídos de maneira tão forte, e com tanto preconceito, que, para que a supremacia branca floresça, as pessoas nem precisam se preocupar ativamente com a supremacia branca. Elas não precisam carregar o fardo de ser abertamente racistas, ou desperdiçar energia oprimindo descaradamente. Não é nada disso.

Tudo o que precisam fazer é ficar em silêncio.

Isso é o mais assustador para mim. E, sendo honesta, é isso que me irrita. Aqueles policiais racistas que continuam nos matando? Há muitos deles, com certeza. Mas vamos continuar falando abertamente, denunciando o comportamento deles e, eventualmente, vamos tirá-los de circulação. Falando relativamente, isso é fácil. Mas sabe o que não é tão fácil?? O que é mais difícil de acontecer? As milhões de pessoas que estão ajudando a proteger aqueles policiais racistas e a blindar os que estão no poder, permanecendo “neutras”. Isso é o que me cansa. São todas as pessoas que pensam isso — em 2020!! —, que ainda podem, de alguma forma, simplesmente optar educadamente por não se posicionar.

É para essas pessoas que eu estou escrevendo agora.

Porque vocês têm o poder de realmente mudar as coisas. E para mim, o primeiro passo para fazer com que essas pessoas mudem seu comportamento é fazer com que entendam o significado desse comportamento. Essa história de “dois lados” não existe. Nunca existiu, é claro — mas especialmente agora. Não neste momento. Não com essas mortes tão recentes e cruéis.

Estou escrevendo isso porque tenho uma plataforma. Pode não ser a maior plataforma do mundo, mas já é maior que a de muita gente. É o que eu tenho. E a única coisa que me motiva a utilizá-la é enviar uma mensagem para as pessoas que se dizem “neutras”. É para dizer que estamos ressignificando algumas dessas palavras por trás das quais elas se escondem.

É para dizer que “analisar os dois lados” significa ter sangue nas mãos — e “se isentar” significa deixar pessoas inocentes morrerem.

É para dizer que a neutralidade sobre a vida dos negros pode muito bem significar um assassinato.

É para dizer que seu silêncio é o joelho no pescoço de George Floyd.

Se você ficar em silêncio, eu não f*** com você, ponto.

E, a propósito, tenho muito orgulho de ser uma atleta. Me sinto incrivelmente orgulhosa de fazer parte desta comunidade. A maneira como tantos atletas diferentes, de tantos esportes diferentes (e com tantas origens diferentes), têm utilizado suas vozes em meio a tudo isso, se levantando contra a injustiça racial e causando um impacto real... É uma coisa linda.

Quando vejo Jaylen Brown organizando uma marcha antirracista. Quando vejo Amanda Zahui B. falando e INSPIRANDO as pessoas. Quando vejo Stephen Jackson lamentando a perda de seu “irmão gêmeo” [George Floyd] com essa combinação de raiva e honra. São mensagens muito poderosas.

Mas é como eu disse: o que realmente vai mexer o ponteiro aqui é todo mundo se envolvendo — incluindo todos os esportistas. Porque também não há espaço para esse silêncio ou “neutralidade” na comunidade de atletas. Aquelas velhas desculpas de não querer perder patrocínios, ou de não querer desagradar certos tipos de fãs, ou como “racistas também compram tênis” ou sei lá o quê, já eram. Não precisamos delas enquanto vidas estão sendo perdidas.

Precisamos enfrentar este momento com responsabilidade, solidariedade e liderança.

E eu sei que isso pode ser feito.

Tipo quando vejo a Elena Delle Donne postando em seus stories no Instagram outro dia… Você não tem ideia do que isso faz com meu espírito ou do que significa para mim. Eu vi a postagem da Elena, e eu estava tipo... Ahhh, eu SABIA que minha companheira de equipe me protegeria. Eu sabia. E isso foi tão bom. Essa é a MVP da nossa liga, uma das mais famosas jogadoras de basquete brancas da atualidade, e agora todos estão vendo como ela é real. Como ela não hesitou, ela tomou uma posição. E foi como se aquele post que ela fez por conta própria tirasse um pouco do peso dos meus ombros. Isso me fez sentir um pouco menos impotente neste mundo.

Acho que também foi um desafio para outros atletas.

Porque não podemos esperar por mais informações. Não há outro lado para ouvir. Não há espaço seguro, nenhum território neutro para se alienar e deixar essas questões de lado. Atletas, se vocês estão lendo isso... Saibam que estamos de olho em vocês. Vou repetir: NÓS ESTAMOS DE OLHO EM VOCÊ. Eu amo todos vocês — e como eu disse, estou muito orgulhosa de ser uma de vocês. Mas você está sendo julgado agora como todo mundo — e se você ficar em silêncio, você é parte do problema.

Se você ficar em silêncio, eu não f*** com você, ponto.

Porque eu só estou aqui tentando me manter viva.

E o seu joelho está no meu pescoço.